quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Qual medo?

Um diário dá conta das investigações sobre "alegados crimes de corrupção, tráfico de influências e branqueamento de capitais" http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1403588, envolvendo administradores de empresas públicas.
Umas semanas atrás, informado por um amigo de um caso semelhante, eventualmente o mesmo, passei a informação para outro amigo, quadro de uma das empresas públicas visadas. Recebi na volta uma resposta politicamente correcta e ilibatória de qualquer responsabilidade da empresa, admitindo abertura para aceitar a existência de "funcionários corruptos e ladrões". Era evidente o constrangimento - tinha-lhe enviado a informação pelo email da empresa; nem conheço outro - e havia pouco tempo que o Presidente da República se tinha queixado de eventuais escutas do governo às suas mensagens electrónicas.
Neste jogo se sombras, quem sabe quem  é quem? Poderá ser que eu esteja a querer "queimar" o meu amigo lá nas suas lutas intestinas? Se sim, porque não lhe bastaria não me responder nada? Porque sentiu necessidade de ilibar a "empresa"?
Evidentemente que, depois da minha gaffe - a de ter comunicado através da rede de emails da empresa -, não estou em condições de continuar a conversa com o meu velho amigo e esclarecer o assunto. Terá que ficar para mais tarde, quando todo este caso se resolver - daqui a muitos anos, como o assegura o funcionamento daquilo a que pomposamente chamamos Justiça.
Como diz uma outra pessoa dos meus conhecimentos, quando se descobriu a organização criminosa que liderava a sua empresa ocorreu uma limpeza, ordenada pelos accionistas. Nessa limpeza, porém, os funcionários que colaboraram com a administração criminosa tiveram o mesmo tratamento dos funcionários que não colaboraram e, por isso, certamente, foram prejudicados nas respectivas carreiras ao longo dos anos.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

sustentabilidade

O nosso modo de vida é frequentemente associado à crise ecológica. Há quem entenda ser esta mais uma expressão do "reencantamento" da Natureza do que uma avaliação cientificamente fundamentada da nossa condição. Para esses, a tendência para o equilíbrio é uma lei da natureza e as forças da natureza são incomensuráveis face ao menor poderio da humanidade - mesmo apetrechada de ciências e tecnologias. Para os menos ecologistas de entre nós, tudo não passa de modismos, de uma mania. Enfim, uma insegurança ontológica , eventualmente causada pela inusitada ânsia de saber (escola para todos? onde já se viu?) ou pelo impacto das notícias dos lobbys conservacionistas.
Na verdade, os cientistas qualificados estão de forma praticamente unânime de acordo em que o efeito de estufa e o aquecimento global são realidades, embora apenas 50% das informações noticiosas dêem conta de tais posições. Quer dizer: 50% de artigos de jornais (resultado de um estudo nos EUA) reflectem posições ultraminoritárias entre os cientistas, a maior parte das vezes sem fazerem referência a isso mesmo.
O encobrimento da insustentabilidade civilizacional do nosso modo de vida não é menos escandaloso. É impossível exportar para a China, para o Brasil, para a África do Sul e para a Índia os nossos hábitos consumistas, como está a acontecer, por razões energéticas, de arrumação de resíduos e de lixos, para não mencionar os direitos humanos. Porém tal coisa nem sequer é referida nem nos debates políticos - feitos à medida das nações e para consumo interno - nem nos jornais e outros meios de comunicação, a maioria aliados dos políticos neste "esquecimento" organizado. O inverso é propalado, afirmando-se a inevitabilidade daquilo que jamais irá acontecer: a chegada dos povos não ocidentais aos benefícios da vida moderna.
Na verdade, se se acabasse com a pobreza nos países ricos a insustentabilidade ecológica seria já muito mais evidente no quotidiano. Por exemplo, seria ainda mais dificil de esconder das novas gerações que, pela primeira vez em vários séculos, o que as velhas gerações esperam dos seus filhos é que desistam de acreditar nos valores dos seus progenitores? Reformas simpáticas para estes últimos (enquanto houver direitos adquiridos e paraquedas dourados) e seja o que Deus quizer para quem venha a seguir!

Gripe pandémica

Hoje arrancou a campanha de vacinação contra a gripe pandémica do pessoal de saúde em Portugal. Dizem as notícias, o director geral da saúde reconheceu que os 5% de profissionais de um hospital que se recusaram tomar a vacina pode ajudar à campanha contra a vacinação.
Reclama o alto funcionário não existir nenhum suporte científico para apoiar as posições adversas à vacinação.  Questionado sobre as lições e atirar da campanha de alerta no Inverno  do hemisfério Sul respondeu estar indisponível para comentar, embora adiantasse ser completamente diferente a gripe sazonal e a gripe pandémica, desde logo por serem diferentes as populações de risco em cada caso.
É extraordinário o temor do Estado perante avaliação que a opinião pública possa fazer de uma campanha de vacinação, dado o facto de ter sido este tipo de intervenções de saúde pública dos maiores contributos para a diminuição drástica da morbilidade no ocidente, nas últimas gerações.
É também estraordinário que, depois de declarado o nível 6 e máximo do alerta global pela Organização Mundial de Saúde, o Estados não possam argumentar ter sido esse estado de alerta a causa eficaz da minimização dos riscos de morbilidade efectiva provocados pela pandemia.
Mais do que uma crise de confiança, podemos muito bem estar a sentir sinais de uma crise de civilização: a) a ciência é trazida a terreiro não para fundamentar políticas mas para defender políticas; b) as acções do Estado não são avaliadas mas tão só desculpadas.

domingo, 25 de outubro de 2009

Durkheim e Adam Smith

A sociologia faz segredo das questões da moral, quando Durkheim a definiu, precisamente, como a ciência da moral e das instituições. Da mesma forma que a economia isolou o Adam Smith da Riqueza das Nações do mesmo autor dos estudos da moral (cf. Jack Barbalet (2008) Weber, Passion and Profits, Cambridge), também a sociologia isolou a moral e, com ela, grande parte das intuições de Durkheim, em especial a defesa da prioridade à moral (e à política, no sentido da difusão da moral) nos processos de desenvolvimento de modos de organização social.
O maior sucesso de Max Weber aconteceu quando ele mais se voltou para a sociologia, na sua Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Quando usou a intuição de Durkheim para a afirmar e desenvolver, com base na ideia actualmente de senso comum da superioridade moral dos protestantes e dos nórdicos relativamente aos católicos e do Sul. Não será altura, para os sociólogos do Sul, revisitarem esta sociologia abandonada por aí - e a fazer os seus estragos, nomeadamente de reforço da auto-alegada superioridade étnica dos ocidentais do Norte? Não nos cabe a nós, precisamente por sermos sociólogos, corrigir os males feitos?

Jovens e violência

Há dois caminhos para a justiça social:
1. Realista, ineficaz e contrproducente: acusar o fígado da cirrose, o sidoso, canceroso, leproso, toxicodependente das respectivas condições de enfermidade.
2. Moral e político eventualmente promotora de melhorias: assunção das responsabilidades dos mais fortes pela qualidade de vida dos mais fracos
(como propôs John Rawls).
É necessário assegurar aos jovens oportunidades de produzirem as respectivas novas identidades, em vez de os queremos reviver através deles, obrigando-os, as nossas próprias experiências de juventude. Para tal será necessário largarmos os nossos egoísmos legitimados com sentimentos de superioridade (de idade ou de condição ou de etnia), cada vez mais insustentáveis, e conquistarmos para a nossa civilização ocidental mais jovens, como aqueles que nos procuram (através dos flucos migratórios) e que estupidamente rechaçamos.

sábado, 24 de outubro de 2009

violência

Ultimamente ando às voltas com a violência.
No 9ª Congresso da ESA, o mês passado, uma colega francesa informou-me que em  França há muitos trabalhos de sociólogos sobre a violência. Felizmente a presidente da mesa, uma colega italiana especialista no tema, retorqui-lhe que eu teria mais razão: a sociologia ignora a violência.
Claro que há sociólogos que falam sobre violência. O problema que coloco é que a teoria social desconsidera a violência como actividade anti-social, produzindo uma desculpa (i)moral para si própria para evitar o assunto, entretanto cada vez mais actual. Nem sequer existe formulada uma subdisciplina reconhecida com o título sociologia da violência, essa é que é a verdade.
Para os sociólogos é mais cómodo poderem continuar a pensar a violência como uma actividade dos brutos, dos jovens, dos pobres, e assim ignorar a violência bem mais estrutural dos mercados, dos capitalismos e dos estados.

É preciso animar a malta

Começa a ser constrangedor não ter onde publicar o que vou escrevendo. Provavelmente não tem nenhuma importãncia, mas ainda assim há quem goste de ler (sabe-se lá porquê) e principalmente sinto haver alguma coisa de inovador naquilo que se constituiu no meu pensamento próprio. A sociologia não é, deste ponto de vista, um saber que alguns sabem e os outros admiram. A sociologia - que é a minha forma de expressão - é um modo de fazer a apologia da humanidade, simplesmente de forma partidariamente controlada: tornou-se uma ideologia de regime, embora de segunda linha.
A esperança que alimento, cada vez mais convencido, é a de que é possível do campo da sociologia emergirem ideias capazes de sustentarem os velhos ideais entretanto vilipendiados, em particular a moral da igualdade.
Vamos ver se este blog me anima.